domingo, abril 10, 2011

PRIMEIRO ENCONTRO



Por Letícia Vidica

Parecia que uma colônia de borboletas estava morando no meu estômago e fazendo uma animada festa rave lá dentro. Minhas mãos suavam. Eu não conseguia me concentrar em nada. Passei o dia todo alheia numa mistura de preocupação e ansiedade. Tudo culpa daquele encontro.

Eu - uma mulher quase à beira dos 30 anos, macaca velha e descolada depois de milhares de encontros - parecia uma adolescente virgem de 16 anos que acaba de ser convidada pelo bonitinho da sala para ir ao cinema, depois de passar anos renegada por todos. E uma adolescente virgem, boba e louca para que o expediente acabasse para contar às suas amigas.

*****

- Nossa, Diana, fala logo que eu não agüento mais de tanta curiosidade... o que você tinha de tão importante para falar? - perguntava Betina que chegava esbaforida ao meu apartamento - Deve ser realmente importante para transferir o encontro sagrado do bar do Pedrão para o seu apartamento!

- Eu tenho um encontro. Eu tenho um encontro! Eu tenho um encontrooooo!!!! - eu dizia cantando, pulando e rodando no meio da minha sala feito uma idiota.

- Com quem?! - perguntavam Lili e Betina sem nada entender.

- Quem é o bofe da vez?

O bofe da vez era o Eduardo. Nos conhecemos numa situação muito inusitada. Eu bati no carro dele. Um dia desses, voltando do trabalho, me distrai com o meu celular que caiu do meu bolso e, ao tentar pegá-lo (naquela velha mania das mulheres de dirigir, trocar de marcha, olhar no espelho e passar batom ao mesmo tempo), eu bati no carro dele. Claro que eu fiquei super envergonhada e nervosa com a situação. Do jeito que minha conta estava no vermelho, pagar pelo conserto do carro de outro não estava nos meus planos. Porém, o Eduardo foi um gentleman. Pediu para que eu ficasse tranqüila, apenas pediu o meu telefone por conveniência e que eu ligasse para ele na semana seguinte só para comprovar que nada tinha acontecido ao carro. E foi o que eu fiz. Liguei e comprovei que não ia ter uma dívida nova e sim uma amizade nova.

O papo que começou sobre a batida do carro terminou em uma conversa descontraída sobre quem éramos. Depois das apresentações formais, Eduardo me convidou para sair para que pudesse conhecer melhor a motorista nervosa, como ele me chamava. E eu? Aceitei claro.

- Diana, só com você essas coisas acontecem. Só você para conhecer um cara depois de bater no carro dele. – comentava Betina.

- É a história mais maluca que já ouvi e também confesso que a mais excitante. – dizia a animada Lili.

- E que tal irmos agora lá no Pedrão comemorar o seu encontro? Isso merece algumas cervejas!!!

- Nada disso, Betina. Hoje vocês não arredam o pé daqui enquanto não me ajudarem a encontrar uma roupa decente para sair com o Eduardo. Olha, tem cerveja gelada na geladeira e beliscos no armário.

- Nossa, Diana, duvido que você não tenha uma roupa decente para ir a esse encontro!!!

Será que eu tinha? Foi o que fui comprovar. Por mais roupas que se tenha no guarda roupa, elas nunca são suficientes para um primeiro encontro. Passei horas provando as mais possíveis e improváveis combinações de roupas do meu armário, mas nada me agradava. As meninas bem que tentavam, mas ou era sexy demais ou freira demais ou executiva demais ou adolescente demais ou me lembravam encontros ruins e blábláblá...

- Definitivamente, eu não tenho uma roupa decente para sair com esse cara. – eu dizia me jogando em cima da trouxa de roupa que se formara sobre a minha cama. – Acho que vou desmarcar.

- Tá louca??? Não seja por isso. Amanhã mesmo vamos ao shopping. – dizia Lili para me animar.

E foi o que fizemos. Na manhã seguinte, com a Lili e a Betina a tira colo, fui ao shopping. Acho até que fomos as primeiras clientes do lugar. Também passei horas no provador de uma loja experimentando as roupas de uma coleção inteira até achar o modelito perfeito para aquele encontro. Já que o meu guarda roupa não tinha colaborado, nada mal comprar uma roupinha nova né?

- Finalmente, agora sim. Essa roupa é perfeita! – eu dizia já suada e esbaforida dentro daquele provador apertado. – Agora, posso ir para casa.

- Casa? E o seu cabelo? E as unhas? – questionava Lili.

Tinha me esquecido completamente disso. Minhas mãos pareciam de lavadeira e meu cabelo uma espiga de milho desbotada. Claro que saí correndo e apelei para o Beto que abriu uma exceção e me encaixou na sua agenda. Ele fazia de tudo para me ver desencalhar.

Depois de mão, pé, depilação, tintura no cabelo, escova e maquiagem...finalmente, fui para casa para me arrumar. E faltavam apenas duas horas para o Eduardo chegar. Incrível como as mulheres sempre se atrasam...ah, mas faz parte do show e do suspense.

- Não esquece de colocar uma lingerie decente, hein, Diana?

- Ai, Lili, eu só vou sair com o cara...eu não vou dar para ele.

- Nunca se sabe...por isso é melhor uma lingerie decente do que ser flagrada com as calcinhas da sua avó hein.

- Tá bom, tá bom. Mas agora vão! Não quero que o Eduardo chegue e veja vocês aqui. Amo vocês. Valeu por tudo.

- Não esquece! Amanhã cedo...liga para mim hein? – cobrava Betina.

***

Pontualmente, ele chegou. Meu coração parecia bateria de escola de samba e minhas pernas bambeavam como vara verde. Ele me esperava do lado de fora. E agora? O que eu faço? Dou a mão? Beijo ele na bochecha formalmente ou vou logo dando um beijo arrasador? Independente do número de encontros que se tenha, é sempre a mesma coisa. A gente nunca sabe o que fazer nessa hora.

Ele me olhou como quem analisa se estou boa o suficiente para entrar no carro e sair com ele e depois me deu um abraço apertado. Ufa, mais fácil. Assim não fiquei com cara de idiota sem saber o que fazer.

- Eu não merecia tanto. Você está linda. – disse ele abrindo gentilmente a porta do carro para mim.

Acho que fiquei corada nesta hora. Tudo bem, sempre fico.

- E aí onde a gente vai? – perguntava ele.

Essa é a hora do encontro que mais odeio. O cara te convida para sair e não sabe onde te levar?! Eu bem que poderia dizer que quero jantar no restaurante mais caro da cidade, será que ele levaria? Prefiro não arriscar.

- Você é quem sabe...como o convite foi seu...vou aonde você quiser.

Essa é a pior resposta para se dar numa hora dessas, mas sempre funciona. Sempre que digo isso percebo que o cara me olha de canto e dá um sorrisinho malicioso como quem pensa: ‘Então tá, gatinha, deixa comigo. Te levo pro motel agora mesmo!!’

- Então deixa comigo. Vou te levar para jantar no meu lugar preferido.

Sabia que ele tinha algo em mente. Eles sempre têm. E geralmente é sempre no lugar preferido. Nunca sei se é o preferido deles ou o preferido para levar uma mulher num primeiro encontro. Mas não importa.

Entre um silêncio e outro, uma música e outra que toca no MP3 player, entre perguntas banais sobre como foi o dia, como São Paulo tem congestionamento mesmo num sábado à noite, entre uma olhadinha indiscreta de canto de olho num semáforo vermelho...chegamos ao tal lugar preferido. Era um restaurante bem aconchegante e romântico também. Com direito à meia luz e velas na mesa. Gostei da preferência.

- Espero que goste. O lugar é simples, mas a comidinha aqui é ótima. – comentava Eduardo

- Boa noite, senhores. O que vão pedir? – perguntava o garçom.

Essa é a hora crucial. É o primeiro passo para saber se vocês tem alguma afinidade e se o relacionamento vai dar certo. Decidir o que pedir para comer quando se sai pela primeira vez com uma pessoa que não conhece é tarefa dificílima.

Ficamos os dois por alguns minutos pesquisando todo o cardápio e os valores (claro!). ‘Hmm adoraria comer isso, mas acho que é muito caro. O cara vai me achar abusada demais’, eu pensava. ‘Ai , meu Deus, tomara que ela não peça isso. Não tenho grana e não sei se meu limite do cartão já estourou.’, era o que eu pensava que ele pensava.

- Que tal esse assado com alcachofras? – sugeria Eduardo.

- Não me leve a mal, mas eu não gosto de alcachofras. Pensei em pedirmos esse peixe. – sugeri.

- Não fique triste também, mas eu não como peixe. – respondia ele.

Pronto. Nada de afinidades gastronômicas. E agora? Nessa hora, o garçom com cara de Mané e com vontade de fuzilar o casal indeciso sugere ‘a moda da casa’. Incrível como ‘a moda da casa’ sempre salva esses momentos? Deveria chamar-se ‘a salvação dos casais indecisos que saem para um primeiro encontro’.

- Então, moça, está tão calada...o que houve?

Como iniciar um assunto em um primeiro encontro? Falar sobre o que? Geralmente, o motivo do silêncio acaba sendo um início.

- Não sei se já me perdoou pela batida.

- Depois desse convite, ainda tem dúvidas? Acho até que se tivesse dado algum dano, eu não te cobraria.- disse ele me olhando e rindo maliciosamente.

- Mas eu faria questão de pagar... Não gosto de ficar devendo.

- E então, Diana? Publicitária? Fale mais de você. Estou curioso para conheça-la melhor.

Falar o que? Como se apresentar a alguém que não conhece? Claro que só posso exaltar as minhas qualidades e jamais posso dizer que estou louca e desesperada a procura de um namorado. Melhor ser formal.

- Bem, tenho 28 anos, moro sozinha, sou publicitária...o que mais quer saber?

Claro que ele queria saber tudo. Gostos musicais, livros preferidos, gosta de sair, curte que tipo de balada, que tipo de música e blábláblá.

- Mas e você, Eduardo? Fala de você ou só eu vou ficar falando aqui?

Eduardo tinha 32 anos, era solteiro, morava com a mãe (os pais são separados), tem dois irmãos mais novos, é engenheiro de formação, mas trabalha como consultor em uma empresa de logística.

E, enquanto tagarelávamos sobre a vida, o que fazíamos, o que gostávamos... íamos também se deliciando com ‘a moda da casa’, acompanhada de um bom suco. Cerveja? Melhor não causar uma impressão ruim de cara. Na primeira, um suco sempre cai bem.

- Aceita uma sobremesa?

Ah, eu bem que adoraria comer uma banana split agora, mas não posso deixar o meu lado Magali assustar de cara.

- Não quero mais nada, obrigada.

- Não mesmo? Você não comeu quase nada!

A comida estava ótima mesmo, mas eu não podia repetir (apesar da vontade). O meu nervosismo e a ansiedade também haviam acabado com a fome.

Chegara então o momento crucial número 2: a conta. Quem paga? Me ofereço para pagar também? Não vejo problema em dividir contas, mas confesso que num primeiro encontro acho bem mais romântico se ele colocar a mão no bolso. Mas se o bolso estiver furado porque não dividir?

Porém, quando insinuei pegar a minha carteira, o Eduardo logo me brecou. Disse que fazia questão de pagar, que ele tinha me convidado e não ia aceitar um centavo. Saí no lucro. Bati no carro do cara, ganhei um encontro e não paguei a conta? Mega sena total.

Saímos do restaurante e antes de entrar no carro ficamos nos encarando fixamente. Será que era agora que ia rolar o beijo? Eduardo aproximou o corpo dele ao meu e me perguntou:

- Está afim de fazer algo ou quer ir para a casa dormir?

Sei muito bem o ‘algo’ que ele queria fazer, mas um suspense é sempre bom.

- Adoraria esticar, mas amanhã tenho um compromisso e tenho que acordar cedo. Não vai ficar chateado?

- Jamais. Adorei essa noite. Você foi uma companhia maravilhosa. – disse ele olhando para meus olhos e depois para os meus lábios.

Silêncio. Respiração ofegante e finalmente o beijo. Interrompido pela buzina do manobrista que trazia o carro. Por que o carro sempre chega na melhor hora?

Seguimos o caminho mais descontraídos, já não éramos mais dois estranhos. Parecíamos até que já tínhamos bastante intimidade.

Ao chegar à porta do meu prédio...

- Obrigada pelo convite. Adorei a noite. – eu disse dando um beijo nele.- A gente se vê então.

- Com certeza e será em breve, mocinha. – disse ele me retribuindo com outro beijo.

Era a deixa para um próximo encontro.

- Só tome cuidado na direção para não bater no carro de outro hein? Não vou gostar nada se alguém quiser te chamar para um encontro. – dizia ele rindo e depois partindo com o carro.

Fiquei parada mais alguns minutos na porta do prédio, suspirando como uma adolescente virgem e boba que beijou pela primeira vez no escurinho do cinema. É sempre assim. Ele parte e você fica suspirando e entra cantarolando e se joga na cama e reprisa os melhores momentos da noite na sua cabeça e adormece com a roupa que chegou e acorda assustada com o telefonema de uma amiga querendo saber tudo, tudinho sobre o encontro.

Pois é, minha amiga, os protagonistas podem até mudar, mas o roteiro é sempre o mesmo e sempre será. Não importa o número de encontros que se tenha.

PAPO DE CALCINHA: Como são seus primeiros encontros, amiga (o)? Sempre o mesmo roteiro? Algum mais especial?

Um comentário:

Rafael disse...

quanto stress e preocupacao para um encontro. ri muito. :D