sábado, julho 26, 2008

CRISE DE IDENTIDADE


Por Letícia Vidica

- Tem gente que vai ficar mais velha amanhã...

- E isso é bom? – perguntava Betina com a amargura rotineira do dia anterior ao seu aniversário.

- Claro que é, Betina!

- Só se for para você que ainda desfruta da casa dos vinte porque para mim, a um dia dos 30 anos, isso é um peso!

Betina estava vivendo mais uma daquelas fases críticas do universo feminino. Ela estava passando pela crise dos 30. Há uma semana, minha amiga resolveu se enfurnar no seu apartamento e não sair mais. E lá estávamos eu e a Lili tentando convencê-la a pelo menos apagar as velinhas no dia seguinte.

- Ai, Betina, que deprê! Também não é pra tanto.

- Não adianta, Lili, vocês não me entendem! Ninguém me entende. Amanhã eu completo três, três décadas de vida e o que eu fiz da minha vida? Sou uma super executiva? Não. Casei com um homem rico? Não. Tenho um homem? Não. O que eu consegui da minha vida?!

Betina desandou a chorar. E nós tentamos todas as cartadas para animá-la até que desistimos, ou melhor, compreendemos que ela tinha o direito a passar por essas crises e por esse momento.

*****

- E aí tá melhor, Bê?

Com muito custo, conseguimos levar a Betina para bebemorar no bar do Pedrão a sua saúde.

- O que seria de mim se não fossem vocês?

- Ih...já vi tudo. Três copos de cerveja e começa a sessão melancolia. – dizia Lili já acostumada com a deprê de bêbado da Betina, ainda mais no dia do seu aniversário.

- É sério gente. Se eu não tivesse vocês, o que eu estaria fazendo hoje? Ninguém me ligou...nenhum flor, nenhuma telemensagem. A única carta que eu recebi foi uma conta atrasada!!!

Mais uma vez, Betina desandou a chorar e a dizer o quanto nos amava e o quanto a vida dela estava uma bosta. Resultado: 5 horas da manhã eu tinha como espetáculo a Betina vomitando no banheiro do meu apê.

***

Apesar de ter sido um porre aturar a minha amiga choramingando no dia do seu aniversário, aquilo tudo me fez refletir sobre a minha vida e sobre os meus objetivos.

Eu estava há 3 anos à beira dos trinta anos e também não havia cumprindo nem um quarto de tudo que eu planejei aos 15 anos. Será que eu ia conseguir cumprir em três anos? Eu tinha poucos dias para me tornar uma publicitária bem sucedida, ter um homem com H do meu lado, ficar sem dívidas, dar a volta ao mundo, falar 3 línguas, me casar e ser feliz para sempre... Será que o tempo seria suficiente para cumprir tudo isso? Será que eu serei a eterna solteirona, mal amada e sem filhos?

Nesses momentos de deprê, só uma pessoa podia me ajudar: minha mãe. Recorri ao seu colinho maternal para chorar minhas pitangas.

- O seu mal minha filha é que você sonha demais. Viva, dê tempo ao tempo. Deixe o tempo fazer as mudanças na sua vida e não queira você mudar o tempo.

- Mas são só três anos para isso, mãe? E se eu não conseguir?

- Será que você vai ser menos feliz por isso? Será que ter tudo isso de uma vez vai te deixar feliz?

As conversas com a minha mãe sempre terminavam com uma interrogação que ficava martelando a minha consciência por um longo tempo. E aquela foi mais dessas interrogações. E que eu ainda não consegui responder.

****

Não só eu e a Betina passávamos por algumas crises, como a Lili também. E a dela foi financeira. Lili era secretária de uma multinacional. Achava que seu emprego era vitalício, só porque já tinha dado umas voltinhas com o chefe. Mas tudo que é bom dura pouco...

- Ai, Diiiii – foi o que Lili conseguiu dizer aos prantos na porta do meu apartamento. Pedi que ela entrasse, se acalmasse e me contasse o que estava acontecendo.

- Eu, e-eeu f-fui mandada embora. Aquele canalha me escurraçou de lá e agora?

- Calma! Agora é olhar pra frente e seguir, minha amiga. Você tem potencial para coisa melhor.

- O pior é que eu to com o aluguel atrasado há 3 meses e vou ser despejada na semana que vem. O que eu faço?

- Se não se importar, posso dividir a minha cama com você.

- Ai, amiga, você me aceitaria?! ... Poxa, o que vale se matar por uma empresa, vestir a tal da camisa e levar um pontapé na manhã seguinte?! Eu estudei, me formei, fiz pós, fiz curso de línguas, me especializei para ser trocada por uma ‘estagiária’ e humilhada? De que adiantou tanto estudo?!

Estávamos na maior crise de identidade! Cada uma com a sua, mas unidas por uma crise que como todas as outras são passageiras. Elas vêm de uma forma que você não pode controlar, você se afoga nela, acha que não tem solução e quando menos espera até esqueceu que ela passou. Esse é o nosso mundo, o nosso universo.

O que seria de nós , mulheres, sem as crises? São elas que nos ajudam a achar a resposta certa nem que seja no momento errado: A Betina saiu da sua deprê quando descobriu como a maturidade dos 30 anos poderia ajudá-la a conquistar o que queria. Eu resolvi parar de me questionar e deixar tempo conspirar ao meu favor e a Lili aprendeu a ir a luta, coisa que ela não estava muito acostumada.

Agora eu aguardo o próximo Tsunami que vai chegar já, já. Só espero que eu não seja a vítima principal!

PAPO DE CALCINHA: Qual foi a sua pior crise de identidade?