domingo, abril 13, 2014

DE PERNAS PRO AR


POR LETÍCIA VIDICA


Tive o meu bate-papo de meninas interrompido pela vibração do meu celular. Cessei a minha gargalhada que, com certeza, tinha sido causada por alguma bobagem que a Lili tinha dito. Dei o último gole, travei uma batalha dentro da minha bolsa até encontrar o meu celular. Ufa!

- Puta que pariu!! Esqueci completamente. Eu tenho exames ginecológicos amanhã de manhã. Que horas são? Que merda! Onze horas. Meninas, tenho que ir embora. Só uma idiota como eu para marcar exames às 07 horas da manhã de uma sexta-feira.

- Relaxa, garota. Não vai. Simples assim.

- Simples assim para você que tem médico particular, Liliana. Eu não tenho Bittencourt no nome. Eu dependo de plano de saúde. Quase um SUS, vamos dizer. Sabe quando eu marquei esses exames? Há dois meses. Beijinhos, amo vocês, mas vou nessa.

****

Quando o meu despertador tocou às 05 horas da manhã, eu quase quis matar a mim mesma. Sonâmbula, tropecei no vento, tomei um banho, coloquei a primeira roupa que sorriu para mim no guarda-roupa, fiz um coque básico, peguei a chave do carro e levei meu corpo para dentro dele.

Incrível que como por mais a gente se programe para chegar com uma hora de antecedência na clínica, essa é uma tarefa puramente impossível. Nem bem raiou o sol e eu já estava no meio do congestionamento.

Finalmente, cheguei na clínica para enfrentar a maratona de exames internas dentro do meu ser. Eu odiava passar por tudo aquilo, mas era necessário. A recepção já estava lotada. Peguei a senha e vi que outras trinta pessoas estavam na minha frente. Olhei os sites, li meus emails, joguei Candy Crush, fucei no facebook até ser chamada.

***

- Diana...

Uma enfermeira que parecia ter a metade da minha idade e o dobro do meu humor àquela hora da manhã me chamou na porta da sala.

- Por aqui, por favor, Dona Diana. Tire toda a parte de baixo e tem um avental ali dentro do banheiro. Fique à vontade.

É possível ficar à vontade dentro de uma sala gelada ao lado de duas mulheres estranhas que estão prestes a analisar a sua mais profunda intimidade?! É, meus amigos, isso é a vulvoscopia e a colposcopia. Só pelo nome já deveria dar medo.

Se não bastasse a enfermeira simpática, agora eu encararia a médica primária feliz.

- Dianinha, abaixa mais. Coloque as pernas nas almofadas e deixe o bumbum bem na pontinha da maca. Vai ser rapidinho...

Apesar da voz doce de professora primária, eu não estava nada confortável parecendo uma rã com as pernas abertas com toda a minha intimidade sendo explorada e cavucada por aquela mulher. Como eu odiava tudo aquilo. Mas, como tudo que está ruim pode piorar, quase desmaiei quando olhei para a televisão à minha frente e vi que minha perseguida era a atração principal. Quem foi o gênio que teve a ideia brilhante de fazer desse exame um verdadeiro big brother? Fechei os olhos porque aquilo tudo estava me dando enjoo.

- Prontinho. Está tudo bem com a sua menininha. - dizia a médica feliz ao finalizar o exame.

Já eu saía como uma pata, com uma leve cólica e muito estranha por saber que aquela mulher agora era tão íntima assim de mim.

***

- Diana. Diana... Diana...

Acho que ainda estava meio tonta ou sonolenta que só ouvi chamarem meu nome na terceira chamada. Ao contrário da enfermeira simpática e da médica feliz, me deparei com uma enfermeira prestes a se aposentar com cara de quem estava totalmente descontente com o trabalho.

- Tira a parte de cima.

Nossa, calma! Seja delicada. Eu sou sensível!

Agora, eu ia encarar um ultrassom de mamas. Isso mesmo. Era a vez de explorar os meus seios. Sem um bom dia sequer, a médica ranzinza jogou aquele gel gelado nos meus seios e começou a fazer a ultrassonografia com aquele aparelho nada agradável. Que situação mais desconfortável! Tentei me concentrar nos afazeres do dia, mas não estava nada bom aquele gelzinho e aquela exploração Discovery Channel nas minhas mamas.

*****

Como eu queria ir para casa, mas ainda faltava o exame mais invasivo de todos. O ultrassom transvaginal. Quem foi o ginecologista depravado que inventou isso?! Além de atrasada para uma reunião importantíssima que eu tinha marcado, contando com a falsa pontualidade dos laboratórios de exame, o meu nome nunca era chamado. Eu já não tinha mais desculpa para inventar para minha secretária sobre o meu atraso.

Trinta longos minutos de atraso depois, muitas lidas na revista Caras (amassada) do ano passado e uma supervisionada no instagram...fui chamada.

A prima da enfermeira simpática chamou o meu nome com uma voz doce de quem anuncia que uma tempestade está por vir. Entrei na sala e dei de cara com um japonês barrigudo com cara de comercial de televisão coreana. Opa! Espera um pouquinho aí. Eu vou ter que abrir as minhas pernas e deixar esse japonês com cara de quem não come ninguém desde a Santa Ceia me explorar com esse aparelho que mais lembra um vibrador?! Pelo amor de Deus, onde é a porta de saída?

- Dona Diana, só tirar toda a parte de baixo. O aventalzinho está pendurado no banheiro. - dizia a enfermeira feliz com voz de quem diz 'Calma! Ele é inofensivo'.

Acho que demorei uns dez minutos ou até mais ou muito mais para sair daquele quadrilátero minúsculo que eles ousam chamar de banheiro. A DR com a minha consciência estava frenética. 'Calma, Diana. É só um exame. Saia desse banheiro, deite na maca e deixa acontecer naturalmente. Não se sinta tão privilegiada. A sua perseguida não será a primeira e nem a última que esse japonês vai examinar', dizia o lado mais sensato da minha consciência. 'Tá louca?! Você não viu o olhar de tarado maníaco sexual que ele lançou sobre você quando entrou na sala?! Vai ter coragem de ficar sozinha nessa sala escura com esse homem desconhecido enquanto ele introduz um aparelho, quase vibrador, dentro de você?! O Pedro não ia gostar nada disso'.

- Tudo bem, dona Diana? - era a enfermeira mega simpática que interrompia meus pensamentos.

Respirei fundo, saí da sala e encarei a triste realidade.

- Bom dia, dona Diana. É apenas um exame de rotina? Pode se deitar e fique à vontade. Serei breve. Qualquer incômodo, me avise. - era o japonês com uma voz que nada lembrava um maníaco sexual. Naquele momento, fiquei com raiva de mim mesma por julgá-lo tanto assim.

Ok, ok. Fiquei contando carneirinhos, pensando no meu dia, no meu almoço, no Pedro... enquanto eu me submetia àquele exame nada agradável.

- Prontinho, dona Diana. Tá tudo bem. Seus exames acabaram ne?

Saí até meio tonta depois de toda aquela exploração e desbravamento no meu corpo. Era como se as coisas estivessem fora do lugar sabe?

****

Pior ou melhor de tudo isso é esperar mais uma eternidade pelos resultados. Recebê-los, abri-los, tentar bancar da Dr. House e ler os diagnósticos. Eu nunca entendo, mas a minha curiosidade fala mais alto.

O melhor do melhor ainda é esperar mais uma outra eternidade para conseguir um espaço na agenda da sua ginecologista só para marcar um retorno. Chegar ao consultório, vê-la abrir os exames com cara de mistério ou de quem vai dar o diagnóstica de alguma doença sexualmente transmissível incurável ou vai te dizer que está grávida de quintuplos. Minutos angustiantes e intermináveis.

- Você está ótima! Seus exames foram perfeitos. Está tudo bem. - diz ela sorrindo.

Como assim?! Quer dizer então que eu me submeto a praticamente uma autópsia das minhas partes mais íntimas, abro as minhas pernas para as pessoas mais estranhas do mundo, acordo cedo e aguardo quase dois meses para sentar no consultório e, em três minutos, receber o diagnóstico que está tudo bem?! Eu sempre soube que estava tudo bem! Não precisaria passar por tudo isso, não é mesmo doutora?

- Ufa! Que bom! Obrigada! - é a única coisa que consigo dizer.

- Mas não se esqueça. Daqui uns seis meses, a gente repete tudo de novo.

Um trilha de filme de terror toca na minha mente, olho para a médica com cara de boneco assassino e sorrio. O que eu posso fazer? Daqui seis meses, tem mais!


PAPO DE CALCINHA: Você também se sente desconfortável com esses exames? Tem alguma história curiosa para nos contar?