quarta-feira, abril 14, 2010

HOMEM TENTAÇÃO


Por Letícia Vidica

Quase todos os dias, eu jurava para mim mesma que evitaria aquele olhar. Que desviaria o caminho “Talvez entrar pela copa seria uma boa idéia. Assim eu não sentiria o seu perfume e muito menos aquela voz de cordeiro me dizendo bom dia”. Porém, eu não sou muito boa em fazer promessas e as descumpria todos os dias ao chegar no trabalho.

A missa era sempre a mesma. Eu chegava, estacionava o meu carro e dava uma fiscalizada para ver se o dele também já estava lá – confesso que ficava bem triste quando não via o possante preto estacionado – daí eu pegava o elevador, subia para o 15º andar e, quando estava me dirigindo à minha sala, inevitavelmente eu tinha que passar frente à dele. Eu tentava controlar os meus olhos, mas eu era abduzida por aquele perfume maravilhoso e pela aquela voz me dizendo “Bom dia, Diana”. Me arrepiava na hora, gaguejava, as pernas ficavam bambas e a minha imaginação ia longe...

- Eu não sei mais o que eu faço, Betina.
- É simples. Cai de boca no cara.
- Nossa como você é prática! – eu retrucava tentando fazer minha amiga entender o quanto era difícil resistir aquele Deus.
- Hello! Posso saber de quem vocês estão falando, por favor? Agora vocês vivem aí de segredinho e eu não sei mais dos babados – dizia Lili morta de ciúmes, mas tenho que admitir que nem todos os segredos eu gostava de dividir com ela. Preferia a sinceridade ríspida da Betina.
- Desculpe Lili, é que tudo aconteceu de repente...

...realmente todo esse feitiço aconteceu de repente na minha vida. O homem tentação ao qual me refiro é o meu colega de trabalho, Paulo. Ele é gerente de marketing da agência onde eu trabalho. Um homem lindo, poliglota, bem formado, bom salário e um charme irresistível. Tudo bem se não fossem os empecilhos: além de estar no auge dos seus 45 anos e fogoso em seus cabelos grisalhos, ele era casado e muito bem casado. Daqueles que tem a foto da família em cima da mesa do escritório. E, o pior, com uma linda mulher. Eu não queria me envolver nessa história maluca outra vez porque eu conheço bem o final desse filme. E não para por aí. Eu e o Pierre estávamos começando a nos entender novamente. Não era um namoro oficial de novo, mas engatávamos uma doce reconciliação.

- E você está esperando o que para dar um mole para ele?
- Muita calma nessa hora, Lili. Nem todo mundo é como você. O cara é casado, a gente trabalha na mesma empresa e ... e... eu estou tentando me acertar com o Pierre de novo.
- Olha se eu fosse você eu não perdia tempo. Tirar uma lasquinha que mal tem? – alfinetava Lili
- Além do mais você já está caidinha nele.


É duro admitir. Mas eu estava com pé e mãos arriados para ele. Eu não sei porquê mas o Paulo exercia um tipo de feitiço sobre mim e eu não conseguia resistir. Minhas pernas bambeavam toda vez que eu o via. Seu perfume me embriagava e eu nunca tive tanto prazer de ir para o trabalho todos os dias. Ele era como um prêmio de consolação que eu queria conquistar. Até sonhos com ele eu andava tendo. Dos mais inocentes aos mais cabeludos. Acho que eu estava pirando.

Numa sexta-feira qualquer, eu resolvi ficar até mais tarde no trabalho para dar conta de uma campanha que eu tinha que entregar na segunda-feira. A galera do escritório tinha ido para o sagrado happy hour e eu preferi aproveitar a solidão do escritório para me concentrar. Mas, de repente uma voz me desconcentrou...

- Ainda por aqui? – disse a voz enfeitiçadora do Paulo depois de me deixar toda arrepiada e de dar um pulo de susto na cadeira.
- Nossa, que susto! – eu disse toda sem graça – pois é...tenho que terminar essa campanha.
- Posso te ajudar em algo? – perguntou ele se aproximando de mim. Fiquei morrendo de medo que ele percebesse que os pêlos dos meus braços estavam arrepiados.
- Que isso, muito obrigada. Não se preocupe. Sua esposa deve estar lhe esperando para o jantar à uma hora dessas – como eu queria ser aquela esposa.
- Ela não está em casa. Eles viajaram para a casa dos pais dela. Eu resolvi voltar ao escritório porque deixei a chave do carro em cima da minha mesa...hmmm...deixe-me ver isto – disse Paulo puxando uma cadeira e sentando-se a um centímetro de distância de mim. Acho que ele podia ouvir como o meu coração pulava no compasso da bateria.

Paulo resolveu me dar umas dicas com a campanha e a hora passou que nem vimos. E eu nem me importei com o tempo porque estar ao lado do Paulo era um sonho – bem tentador – mas um sonho. Infelizmente, acordei do sonho quando o meu celular tocou e vi que era o Pierre. Eu havia esquecido completamente que a gente tinha combinado de se ver hoje. O Paulo me fazia esquecer até o meu nome. Depois de ouvir a voz irritada do Píerre do outro lado da linha pelo meu esquecimento, justifiquei dizendo que tinha que trabalhar até mais tarde e que seria melhor nos vermos amanhã.

- Seu namorado? – perguntou Paulo
- É...não é bem um namorado ...um amigo, digamos assim.
- Desculpe tomar o seu tempo...
- Que isso, eu que agradeço pelas dicas, mas acho que já está na hora de irmos né?
- Posso lhe fazer um convite? – disse Paulo olhando profundamente nos meus olhos. É claro que ele podia fazer o convite que fosse que eu diria sim.
- Que tal um drinque para relaxarmos? Posso te deixar em casa se você quiser depois.

Topei na hora. Deixei meu carro no estacionamento da empresa e fomos a um bar no carro dele. O Paulo me levou a um bar com música ao vivo super aconchegante. Eu não conseguia acreditar que estávamos ali juntinhos naquela noite.

Bebemos algumas doses de vinho e jogamos conversa fora. Primeiro falamos de trabalho e depois de alguns copinhos de álcool filosofávamos sobre a vida. Paulo me contou que era casado há 10 anos e que se casou porque sua mulher engravidou, mas que eles eram muito apaixonados, porém passavam por uma crise conjugal no momento. Ele não sabia mais se ela o fazia feliz e nem se ele a fazia feliz. É óbvio que eu adorei saber que eu tinha chance. Só não gostei quando ele começou a perguntar sobre o meu relacionamento com o cara do celular, o Pierre. Foi difícil explicar, e como toda boa mulher que sou, disse a verdade. Contei que tínhamos namorado por um tempo, nos separado e que agora tentávamos reconciliar.

Lá pelas três da madruga resolvemos ir embora. Ao chegar no estacionamento, Paulo com seu cavalheirismo abriu a porta do carro para mim. Entrei e seguimos conversando...

- Nossa, Diana, você não sabe o quanto eu precisava relaxar. Foi uma glória ter esquecido as chaves no escritório.

- Eu é quem tenho que agradecer. Graças as suas dicas minha campanha está finalizada.

- Só valeu pelas dicas? – confesso que engasguei com aquela pergunta. O que eu responderia? Apenas sorri encabulada e cabisbaixa.

Um silêncio tomou conta do ar. Mas Paulo quebrou...

- Espero que o Pietro, ops, Pierre saiba te dar valor dessa vez. Um homem que perde uma mulher como você só pode ser um imbecil.

Confesso que eu não esperava aquela sinceridade, mas começava a perceber que talvez o feitiço fosse recíproco.

- Sabe que você é uma mulher muito bonita, atraente, inteligente...adoro mulheres assim...tenho que confessar que é um martírio te ver todos os dias com esse perfume irresistivel – disse ele fungando o meu pescoço – fico sempre atento para te ver passar e lhe dar bom dia.

Só podia ser um sonho. Ele tinha o mesmo desejo que eu. Eu era a mulher tentação dele. Naquele momento, ele parou o carro em uma rua escura. Eu não fazia idéia de onde eu estava. Começou a alisar o meu cabelo e a me encher de elogios. Tentei esquivar. Naquele momento, fiquei muito dividida. Eu estava prestes a realizar o meu sonho, mas até que ponto essa tentação valia? Ele era casado. Seria mais um rolo na minha vida. E eu? E o Pierre? Eram tantas dúvidas que eu apenas fiz uma coisa: me deixei levar. Transamos ali mesmo no banco traseiro do carro. Foi incrível...


- Que tudo!!! Diana você não vale nada, mas eu gosto de você !!! – vibrava Betina que logicamente deu plantão logo cedo em casa para saber do babado
- Ai, Betina, estou arrependida. Consciência pesada.
- Arrependida?! Eu não te entendo. Até ontem estava aí toda melindrosa louca para ser possuída pelo Paulo e agora dói a consciência?!
- Mas e o Pierre? Não é justo. Justo agora que a gente está se acertando?! Ele está fazendo um super esforço para gente se acertar.
- E vocês vão se acertar.
- Como assim? Como eu vou olhar para cara dele hoje sabendo que ontem eu estava dando pro meu gerente de marketing?!
- Diana, vira a página. Rolou e acabou. O Paulo foi só um homem tentação. Tipo aquele brigadeiro que você quer comer, come, se satisfaz e pronto!
- Homem tentação?! Você e suas definições hahahahaha Tudo bem. Vou tentar esquecer, só espero não cair em tentação de novo.
- É sempre bom repetir a dose né?

Confesso que foi difícil resistir às investidas do Paulo, mas resolvi ouvir minha consciência e tentar ficar com o certo do que com o duvidoso. Colocamos uma pedra naquele episódio. Ele se acertou com a esposa e eu estou aqui tentando me acertar com alguém.

PAPO DE CALCINHA: VOCÊ JÁ CAIU OU RESISTIU A UMA TENTAÇÃO?