terça-feira, julho 20, 2010

PAIXONITE AGUDA


Por Letícia Vidica

Quem foi que disse que o vírus da dengue ou da gripe suína são os piores do mundo? Eu discordo em número, gênero e grau. O da paixonite aguda é pior ainda. E toda mulher em sã ou sem consciência será picada por ele um dia e vai sofrer desse mal. Eu, quase sempre, sofro dele.

Ele vem da noite por dia e quando eu menos percebo, lá estou eu apaixonada mais uma vez. E, na maioria das vezes, por alguém que não faz a mínima idéia de quem sou eu. E aquela era mais uma época de contágio.

- Gente, estou apaixonada! – eu revelava às minhas amigas enquanto dividíamos um balde de pipocas assistindo a um filme romântico.

- Por quem dessa vez, Diana? Porque semana passada você me disse a mesma coisa. – retrucava Betina sem prestar muita atenção a minha declaração nem um pouco inédita.

- É sério, Betina. Eu estou apaixonada de verdade!

Eu realmente achava que estava apaixonada. E a vítima da vez era um homem que eu apenas encontrava na hora do almoço no restaurante a quilo que eu comia. Detalhe: eu não fazia idéia do nome dele, onde ele trabalhava, o que ele fazia, mas só sei que meu coração acelerava toda vez que eu o via.

Bastava ele entrar pela porta do restaurante – sempre de terno -, mexer nos cabelos e se dirigir ao bufê que as minhas pernas já tremiam, meu coração acelerava e eu parecia uma adolescente boba da época do ginásio.

- Mas você ao mesmo sabe o nome dele, Diana? – perguntava Betina depois da minha revelação.

- Não, eu não sei, Bê. Mas eu vou descobrir. Ah e o quê importa?
Uma das coisas que dá mais graça a paixonite aguda é o mistério. Tanta emoção por algo misterioso. Acho que essa era a graça de se apaixonar por um desconhecido. O mistério.

Apesar disso, eu bem que tentava descobrir alguma coisa sobre a vida dele. Além de apaixonada, agia como uma detetive. Eu fazia o máximo de esforço para ir almoçar às 13 horas pontualmente e chegar no restaurante às 13h12. Hora que ele costumava chegar.

Como sempre andava de terno, eu logo imaginava que ele deveria ser um advogado. Outro dia, o vi com um livro do Código Civil nas mãos. Não tinha aliança. Logo deveria ser solteiro ou separado porque o grisalho dos seus cabelos indicava que ele já passava dos 35 anos de idade. Ele sempre ia almoçar com dois amigos. Acho que ele é uma pessoa que não confia muito nas pessoas. Discreto porque seus ternos alternavam entre o azul marinho e o preto. Quase nunca faltava ao nosso encontro às escondidas (inclusive escondido dele) na hora do almoço. Homem trabalhador e comprometido com o trabalho.

- Diana, não sei por que você perdeu tempo com a publicidade. Você daria uma ótima psicóloga. – dizia Betina abismada com a minha observação.

- Ai, ele é tão lindo!! Ai, ai. Ontem à noite, sonhei com ele acredita? Mas eu não conseguia ouvir a voz dele.

- Acho que tá mais do que na hora de você dar uma investida nesse cara né? Chega de bancar a adolescente, Diana.

- Não. Eu não quero. Melhor assim. Prefiro que ele me note.

E quase sempre era difícil ele me notar. Por mais que eu o observava diariamente, ele parecia não me enxergar. Era como se eu fosse um fantasma. Aquilo ao mesmo tempo me doía o coração, mas também me aliviava. Eu gostava de ficar no anonimato.

Certo dia, eu estava no ponto de ônibus esperando a condução para ir embora do trabalho porque meu carro tinha quebrado, ele se aproximou de mim e ficou ali lado a lado esperando o ônibus.

Meu coração quase saiu pela boca. O que dizer? Será que ele se lembrava de mim lá do restaurante? Será que eu ainda estou cheirando perfume? Foram tantas perguntas que ele acabou subindo num ônibus rumo à zona oeste e eu perdi a oportunidade.

- Não creio que você ficou igual uma pamonha e não disse nada?!

- Bê, eu não consegui. Sei lá o que me deu. Até parece que você não sabe como são essas coisas?

- Graças a Deus, eu não sei mesmo.

Aquela paixonite aguda já durava mais de três meses. Estava achando até que eu ia para o livro dos recordes. E eu continuava na mesma. Sem saber nada sobre ele. Até aquele dia lá na agência...

- Pessoal, gostaria que todos conhecessem o nosso novo funcionário, Ronilson!

Parecia coisa de filme de Hollywood, o tal do Ronilson era ele. Ronilson? Como assim? Que nome mais feio para um cara tão gato. Demorei para me recompor e acreditar que ele seria o meu colega de trabalho. Ronilson tinha sido contratado para trabalhar na área jurídica da agência. Pelo menos, a profissão eu acertei. E o que eu faria agora?

- Vai esperar mais o quê para falar com ele? O cara agora está na sala ao lado. – Betina tentava me encorajar.

Eu bem que tentei, mas perdi o tesão. Depois que eu descobri que ele era o Ronilson e que ele passou a ficar ao meu lado todos os dias, a paixão esfriou, perdeu a graça.
- Como assim, perdeu o tesão? Até outro dia você não estava aí toda boba por ele? Não te entendo.

- Não sei, Betina, cansei. A paixão acabou. Sei lá, passou.

- E quem é a próxima vítima?

- Tem um carinha lindo que eu vejo todo dia lá no estacionamento...acho que estou apaixonada.

Nem preciso dizer que a Betina riu e se preparou para ouvir a mesma ladainha. Era sempre assim. Na mesma velocidade que as paixonites vinham, elas iam. Às vezes, é um pouco difícil lidar com isso, mas enquanto a vacina não chega, vou lidando.

PAPO DE CALCINHA: Você costuma se apaixonar com frequência e repentinamente? Acredita em paixonite?