sábado, setembro 05, 2009

MULHERES QUE AMAM DEMAIS


Por Letícia Vidica

- Nossa, Lili, como você está magra!!! Tudo bem que precisava perder um quilinhos, mas não precisava virar um esqueleto... - comentava ao encontrar minha amiga com a pior cara do mundo, enfurnada em seu apê.
- Aposto que isso tem coisa de um tal de Luis Otávio...
- Não me fala o nome desse canalha, Betina! - dizia a amante enfurecida
- Calma, mas meu Deus, o que ele fez dessa vez?
- O Luis Otávio terminou comigo ... ontem...
- E qual a novidade nisso?
- Pega leve, Betina, não está vendo que a coisa não tá boa?
- Pega leve o c...!!! Isso não é mais novidade para ninguém aqui. Eu já perdi as contas das vezes que você e esse canalha do Otávio terminaram.
- Nisso, eu tenho que concordar, Lili. A Betina está certa. Vocês terminam praticamente quatro vezes por mês. Você nem tinha que se assustar mais com isso...
- Para vocês duas que são corações gelados é fácil falar né? Parece até que não me conhecem...

Realmente, parece que naquele momento por um instante eu e a Betina havíamos esquecido quem era a Lili. A Lili é uma mulher romântica por natureza que acredita e que faz de toda história de amor um conto de fadas, acredita em príncipes encantados montados em um lindo cavalo branco. O problema é que os príncipes não aparecem para ela, ou melhor, ela insiste em escolher os dragões e acha que são príncipes, entende? Daí, quando o dragão solta seu fogaréu e abandona a princesa, Lili entra numa depressão e num sofrimento profundo. Ela é a típica Mulher Que Ama Demais. Se não bastasse amar demais, minha querida amiga sofre demais também e por quem nunca merece o seu sofrimento.

Naquele dia, Lili estava enfurnada em seu apartamento porque levara um fora do seu dragão encantado, o Otávio. Um sedutor pirata e um canalha de primeira. Porém, foi por ele que Lili se apaixonou e é capaz de morrer se for preciso.

- Tá, Lili, não adiante te convencer que o Otávio não presta. Mas peraí, vai ficar nessa cama até quando? - dizia Betina já sem paciência com mais uma das crises de amor da Lili.
- Me deixem em paz, eu vou ficar aqui até ele voltar. Eu não tenho forças para levantar.
- E se ele não voltar? Vai morrer aí?
- Quem sabe assim, Diana, ele se dá conta de que eu o amo de verdade.

Estava difícil convencer Lili a levantar daquela cama. Já que ela não sairia da cama, nos também não sairíamos do apê dela. Para passar o tempo, resolvemos fazer uma faxina no chiqueiro. Quando Lili entra nas crises depressivas de amor, se tranca no quarto, não toma banho, esquece de comer e também esquece de manter o mínimo de higiene e limpeza da sua casa. Parece loucura, pode até ser, um transtorno psicológico, sei lá, mas é a pura verdade.Dolorosa verdade.

- Amiga, já que você não quer sair da cama. Nós também não vamos te abandonar. Não arredamos o pé daqui!! - dissemos eu e Betina nos juntando a nossa amiga depressiva com um balde de pipocas na mão.

- Lili, você já tentou procurar ajuda? Outro dia você comentou que estava fazendo terapia...
- Parei. Terapia para quê? Aquela mulher só sabia dizer que eu tinha que largar do Otávio, que ele não fazia bem para mim, que eu estava me autodestruindo...
- Ah (risos) Talvez ela estivesse certa né, Lili? - questionou Betina
- Você tem que insistir. Uma boa terapia é o único remédio para te ajudar a lidar com esses sentimentos. Não adianta ficar fugindo da verdade né? Ela é dura, mas necessária.
- O que vai ser da minha vida sem ele? Eu não posso ficar sozinha, eu não sei ficar sozinha...me sinto sem chão...tô com uma dor no peito que parece que vou enfartar...tenho falta de ar durante o dia, não tenho fome, não tenho sono...perdi a única coisa que dava sentido a minha vida.
- Não seja exagerada, Lili. O Otávio podia te dar tudo, menos sentido à sua vida. O Otávio suga as suas energias. Olhe para você. Olha o estado que ele te deixou?

Por mais que a gente tentasse argumentar, não entrava na cabeça dela que sofrer daquele jeito não adiantaria nada. O problema é que aquilo não era um sofrimento normal. Era uma doença. E eu ali naquele quarto vendo minha amiga se definhar por causa de um canalha que não vale meio centavo de dólar, me sentia impotente.

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Eu sou do tipo de mulher que também sofre por amor, mas é um sofrimento na medida. Pelo menos, eu acho. Toda vez que eu brigo com o Pierre me sinto muito mal. Não tenho fome e também fico triste por dias e dias. Mas nada que se compare ao sofrimento que Lili sente.

Me lembro apenas de um único episódio que me levou a um sofrimento extremo. Eu devia ter uns vinte anos. Jovem, cheia de sonhos, esperanças, bonita. Uma presa fácil para qualquer sem-vergonha. Acabei me apaixonando por um garoto do último ano de medicina que também morava no mesmo campus que eu. Nos conhecemos numa dessas festas de faculdade, ficamos e ficamos e ficamos. O rolo já estava bem sério. Ele me apresentava para todos os amigos como sua namorada, fui visitar os pais dele em Ribeirão. Era 'love is in the air' total.

Porém, teve um final de semana que eu vim para São Paulo para visitar minha família e disse a ele que voltaria em dois, três dias. Insisti para que ele me acompanhasse, mas ele disse que teria que estudar para um exame complicadíssimo de anatomia humana que ele teria nos próximos dias.

Por conta de alguns imprevistos, acabei voltando um dia antes do previsto. Resolvi então fazer uma surpresinha para o meu amado. Fui correndo para o quarto dele no campus e sem hesitar abri a porta do quarto cheia de saudades e presenciei a aula de anatomia humana que ele estava praticando literalmente com a minha melhor amiga e colega de quarto do campus. Não teve tempo para explicações e nem discursos.

Tive a sensação que o chão tinha saído debaixo dos meus pés. Voltei para a casa dos meus pais e passei uns quinze dias de cama. Não queria comer, nem dormir, nem tomar banho. Só chorava. O tempo inteiro. E sentia uma dor imensa no peito que doía e me dava pontadas. Meus pais obviamente achavam que tudo aquilo era loucura, mas com o passar dos dias começaram a ficar preocupados com o meu estado de depressão profunda. Achei literalmente que eu morreria. Só consegui me recuperar por ajuda divina. Até hoje não sei como, mas consegui me levantar literalmente da cama e prometi a mim mesma que nunca mais ficaria assim por ninguém.

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Passamos aquela noite toda no apartamento da Lili. Com muito custo, conselho e broncas, ela conseguiu pegar no sono. E eu e a Betina ficamos a noite toda pescando os olhos, pois de preocupação a gente não conseguia dormir. Para não atrapalhar a primeira noite de sono depois de muitas mal dormidas da Lili, fomos fofocar e fumar na varanda.

- Sabe, eu não consigo entender porque a Lili fica desse jeito.
- Ela ama demais, Betina.
- Tudo bem querer amar, mas sofrer a esse extremo é loucura!!!! Qualquer dia ela se mata por isso.
- Vira essa boca para lá, Bê.
- É verdade...isso tá ficando cada vez mais sério... pensei até em ligar para a mãe dela, mas...
- De nada adiantaria. Aquela dondoca da mãe dela só quer saber de tomar pílulas antienvelhecimento e traçar garotinhos. Nunca vi família mais desequilibrada.
- Vai ver é por isso que a Lili fica assim né?

...

- Meninas? - disse Lili com a cara amassada na porta da varanda
- Lili?! Desculpe, te acordamos?
- Vocês passaram a noite toda acordadas?! Nem sei como agradecer pelo carinho, mas vocês não podem anular a vida de vocês pela minha...
- Você é que não pode anular a sua, amiga.
- Podem ir embora. Eu vou ficar bem.
- Vai mesmo?
- Vou sim, Diana - disse Lili me dando um abraço e um beijo
- Promete que vai dar notícias?
- Prometo, Betina!

Fomos embora de coração partido, apesar de sabermos o fim daquela história que sempre era a mesma. Em poucos dias, o Otávio apareceria. Ia se declarar fajutamente para ela, ela acreditaria, iam viver mais um conto de fadas pirata até o próximo pé na bunda, no qual Lili ia sofer demais. Demais por amar demais.

PAPO DE CALCINHA: Você é uma mulher que ama demais? Ou conhece alguma?

6 comentários:

Ana Keiko disse...

Passei exatamente pelo que a Lili passou....
Só acordei depois que me vi super mal e acabada e ele ali todo sorridente curtindo a vida....
Nunca é fácil admitir que o conto de fadas que você sempre sonhou não passa de uma ilusão...

Flávia Pan disse...

Nunca tive paciência de ficar sofrendo em casa...mas tenho amigas de dar dó e q sofrem por tudo, nào só por amor. Pior ainda pensar em aumentar a dosagem do remédio por pensar q assim tudo se tornará mais colorido. Triste realidade de várias mulheres...pra mim isso é falta de amor próprio. Enfim, viva a vida!!

Anônimo disse...

Gente e existe pessoas assim mesmo, não é ?!?!
Cara tinha que fazer um tour com essas pessoas para a Africa .... ai eles ia saber o que É sofrer.
Não deu certo.... faz a fila andar e pronto ué !!

Vivi Lolis super prática.

Ana Keiko disse...

Flávia vc está certíssima.....
Era falta de amor próprio mesmo...Depois que vc descobre que sua felicidade depende só de vc tdo isso se torna pequeno demais, se não percebe isso não adianta de nada ver o sofrimento dos outros seja por aqui ou dando um passeio na África.....

Anônimo disse...

Já sofri muito por ilusões e decepções amorosas, hoje não mais. Acho que a maioria passa por isso, principalmente quando se é muito jovem. Ainda bem que tudo passa!

Anônimo disse...

"Passei exatamente pelo que a Lili passou....
Só acordei depois que me vi super mal e acabada e ele ali todo sorridente curtindo a vida....
Nunca é fácil admitir que o conto de fadas que você sempre sonhou não passa de uma ilusão..."