quarta-feira, dezembro 29, 2010

ATÉ QUE AS ESCOVAS DE DENTE NOS SEPARE


Por Letícia Vidica


Se não fossem as roupas do Pierre espalhadas pela casa, o vaso sanitário de tampa aberta e com respingos de urina, as escovas de dente no armário do meu banheiro ou as latas de cerveja e energético na minha geladeira, eu mal teria percebido que o Pierre estava de mala e cuia lá em casa.

Já fazia mais de um ano que a gente estava junto e ele foi entrando na minha vida tão rápido que eu mal percebi que também tinha entrado no meu apartamento. Mas, a presença surpresa da minha mãe naquele domingo de manhã me flagrando despenteada e sonolenta me despertou para esse fato.

- Oi, filha! Te acordei? Se bem que já passou da hora de levantar né? – dizia ela olhando para o relógio e não perdendo a oportunidade de me recriminar.

Antes que eu pudesse dizer algo, o Pierre apareceu de cuecas e sem camisa no meio da minha sala para o espanto de toda a moral da minha mãe.

- Ops, desculpa sogrinha. Não sabia que a senhora estava aí. Vou aproveitar para me trocar e buscar uns pãezinhos para gente na padaria.

Eu apenas me sentei no sofá e preparei os ouvidos para o interrogatório que começou enquanto ele tinha ido saído.

- Diana, o Pierre está morando com você?

- Que história maluca, mãe. Ele apenas dormiu aqui em casa.

- Como na semana passada quando seu pai esteve aqui? Não adianta me enganar, Diana. Sei que você não mora mais com a gente, mas enquanto nós formos vivos não vamos aceitar bagunça. Eu e seu pai não vamos aceitar filha morando com namorado sem papel passado.

Nem adiantava eu perder o meu tempo tentando explicar para minha mãe que os tempos eram outros e que nem passava pela minha cabeça, naquele momento, morar com ele. Mas, como sempre, o sermão da minha mãe me despertou para um fato que estava diante dos meus olhos e eu não via. O Pierre estava morando comigo.

No começo, ele dormia em casa com a desculpa de ficar mais tempo comigo, depois com a desculpa de dirigir porque morava longe e depois de um tempo não havia mais desculpa para isso. Ele simplesmente estava lá e pronto. Até a mãe dele ligava na minha casa para matar a saudade do filho que mal parava na casa dele.

- Oi, Diana, o Pierre está aí? – perguntava minha querida sogrinha.

- Está tomando banho.

- Eu sabia que eu ia achar ele aí. Parece até que esqueceu que tem família. Só vive enfiado na sua casa agora né?

Se não bastasse o sermão puritano dos meus pais, eu ainda tinha que agüentar a encheção da sogra.

No começo, a vinda do Pierre para a minha casa foi um mar de rosas. Era bom tê-lo quase todos os dias ao meu lado, na minha cama, me fazendo ninar e me oferecendo sexo na hora e no lugar que eu quisesse. Porém, com o tempo, eu me cansei de inventar pratos novos e optei pelo macarrão instantâneo; deixei a lingerie sexy de lado e vesti o pijama velho de bolinhas; esqueci até a delicadeza e comecei a dividir com ele certos hábitos nojentos do ser humano que todo namorado finge esquecer.
A gente estava vivendo uma vida de casado sem estar casado. E, quando isso acontece, não há como fugir da rotina nem das temidas brigas imbecis que surgem com a convivência.

- Pierre, quantas vezes eu vou ter que pedir para você não deixar suas roupas espalhadas pela casa? – eu dizia furiosa ao chegar do trabalho e ver que a cueca e o moleton que ele usou no domingo ainda estavam caídos ao lado do sofá – detalhe, era sexta-feira.

- Eu já vou guardar, amor. – dizia ele sem tirar o olho da televisão.

- Quando? Ano que vem? Isso tá desde domingo aqui! Tô cansada. Minha casa tá virando um chiqueiro!

- Não exagera, Diana. Eu já vou pegar.

- Eu quero que você pegue isso agora! – eu disse desligando a televisão.

Pierre então se levantava nervoso, recolhia a roupa, jogava em um canto qualquer e saía de casa dizendo que não agüentava mais morar comigo, que eu era chata e que ele ia voltar para casa da mãe dele. No final, ele aparecia de volta no dia seguinte.
Mesmo sabendo o fim da novela, eu estava me cansando de tudo isso. Queria meu canto, minha liberdade de volta.

- Meninas, acho que vou expulsar o Pierre de casa. – eu desabafava com Betina e Lili.

- O que aconteceu? Vocês terminaram? – perguntava Lili assustada.

- Não. É que eu não agüento mais ele lá em casa. A gente briga toda hora por besteira, já nem transamos direito, sem contar que o meu apartamento virou um chiqueiro e que eu perdi a minha liberdade dentro da minha própria casa!

- Apoiada! Eu disse a você que esse negócio de dividir apartamento com homem depois de morar sozinha por muito tempo não dá certo. O negócio é ele lá e você cá.

- Pois é, Betina. O pior é que eu não sei como dizer isso pro Pierre.

- Acho besteira. Ele pode ficar bravo, entender tudo errado e você ficar chupando o dedo.

- Será, Lili?

- Não vai na dela, Diana, Conversa com jeitinho. Ele vai saber entender. – incentivava Betina.


Agüentei aquela vida de casado por mais um mês, mas quando vi que a idéia de casar realmente estava fazendo parte da cabeça do Pierre, tive que surtar.

Certa noite, ele chegou em casa com um convite de casamento de um amigo dele. Sondou dizendo que todos os amigos dele estavam casando e só ele ficando para trás e que a gente devia aproveitar a oportunidade e pensar no assunto também. Foi a deixa.

- Acho ótima idéia, mas enquanto a gente pensa, você na sua casa e eu na minha ok?

- Como assim, Di? – questionou Pierre de olhos arregalados.

- Não me leve a mal, mas a gente já está praticamente casados e desse jeito eu não quero. Olha só para a minha casa? Eu não tenho mais organização, não tenho mais espaço para mim, me sinto sufocada. Sem contar que a gente ultimamente só briga por coisas banais, nem sexo a gente faz mais direito. Desculpe, Pi. Não estou terminando a nossa relação. Só quero ter você aqui em casa como era antes. Quero ter saudades, poder preparar um jantar especial, vestir uma lingerie nova...você me entende né?

Ele me olhou com semblante de mistério, depois me deu um abraço e um beijo prolongado na testa.

- Você tem toda razão. Eu nem percebi a invasão. Acho melhor separar nossas escovas de dente mesmo.

Nos olhamos, rimos e mesmo espantada com a decisão dele também, me deixei levar e aproveitamos aquela noite para reacender a chama da nossa paixão e finalizar o nosso ‘casamento’.

PAPO DE CALCINHA: E, VOCÊ, JÁ TEVE QUE DIVIDIR A CASA COM ALGUÉM? GOSTOU? DEU CERTO OU TEVE QUE 'SEPARAR' AS ESCOVAS?

2 comentários:

Anônimo disse...

A Diana tem razão. Bagunça ninguém merece! Ou os dois são organizadinhos ou são bagunceiros!
Gosto muito da forma que vc aborda certos assuntos tão comuns e tão corriqueiros a inúmeras pessoas, por isso gosto tanto de seu blog :)

Unknown disse...

Eu amei o Seu Blooooooooog'

To seguindo!